sábado, fevereiro 28

. guardar .

hoje estou pensando em quantas histórias há por aí. em como os acontecimentos se tornam histórias. seja em memória ou imaginação. gosto de coletar como quem recolhe sementes e flores. algumas nem reconhecemos como histórias, mas com o passar do tempo ela vai se moldando e nasce uma narrativa seja qualquer for a utilidade.

percebi que há um momento da noite em que eu organizo o máximo que a minha memória consegue sustentar. algumas anoto em um caderno que ganhei há anos e está lá para que eu não me esqueça. outras perco na dança do esquecimento.

e imagino, na vida das pessoas, os personagens que são e o que fazem falta.

. coração partido .

assistir a um coração se partindo ainda é das coisas mais difíceis de não se emocionar.
é um navio cujos marinheiros encontraram seu porto e fica deriva ao mar.

segunda-feira, fevereiro 23

. véspera de carnaval .

era véspera de carnaval. eu estava na rodoviárias esperando uma amiga e havia esse homem sentado na minha frente na área de espera. percebia-se quem esperava para ir embora e quem estava esperando alguém.

acho que esse homem estava triste. de quando em quando, livrava-se de uma profunda agonia para se recompor naquele cenário de espera. olhava para o relógio grande pendurado e comparava ao seu relógio e passagem. talvez fosse alguém que nunca tivesse viajado porque sua mala não era grande para que mudasse, nem pequena para que voltasse.

fiquei observando com o canto do olho para que não se sentisse constrangido, mas eu estava muito curioso. então cheguei a conclusão que alguém havia partido seu coração e que talvez tenha sido a primeria vez ou que tenha sido para ele, a última.

enquanto esperava, pensei se ele suportaria até a quarta-feira de cinzas.
e suportando, se teria uma fantasia para o próximo ano.

segunda-feira, fevereiro 16

infância II

eu achava que se você pensava profundamente em uma pessoa, ela seria capaz, de alguma forma, de ouvir. como um chamado torto. porque eu mesmo tinha relances durante o dia de me pegar pensando acidentalmente em alguém.

mas pensando melhor, não acredito que alguém tenha pensado em mim tão profundamente a ponto de me chamar.

domingo, fevereiro 15

infância (tem acento?)

o que lembro de meu colégio é a sensação de que não precisávamos de borracha no outro lado do lápis.

geleiras

mariete estava lendo um livro sobre geleiras como se não existissem mais. parava-me enquanto andávamos para falar sobre o quão potável era a água que formava a geleira, muito mais que as chuvas das quais costumamos nos orgulhar. "a chuva bem ou mal é ácida porque tem gás carbônico", dizia. ela não tinha muita simpatia pelo gás carbônico pelo que entendi.

fiquei pensando que tipo de sede vamos ter no futuro.

Tennesse Williams

"Às vezes me questiono se perdoei minha mãe por ter me ensinado a esperar mais amor e delicadeza do mundo do que eu próprio poderia oferecer."

segunda-feira, fevereiro 9

armadilha da ana

escrevi tanto que agora me vejo tentando ser sincero.

atraso

os seus olhos claros me fizeram perder a hora.
olhava para eles e não queria ir embora.

domingo, fevereiro 8

palavras

acreditamos (temos que acreditar) que as palavras são a ferramenta que nos ajuda a manter a memória. porque o nosso destino do perecível nos despedaça ao esquecimento. mas quanto tolo somos por não desconfiar que são as palavras que estão impregnadas de nós. que elas agem a revelia do que queremos que permaneça.

as palavras nos chantegeiam a nos inventar porque para elas o perecível é também ferramenta. não importa o quanto eu queira me manter específico. as palavras já possuem um desvario que me leva pelo braço.

auteridade

é engraçado que me vendo em outros contextos eu pareço mais comigo.

segunda-feira, fevereiro 2

a hora mágica

moravam naquela casa de esquina uma mulher muito grande e um homem pequeno que se apaixonaram. era muito difícil vê-los juntos pois tinham horários incompatíveis: ela era enfermeira e ele mecânico de precisão. as pessoas diurnas a conheciam, as noturnas, não. o mesmo, ao contrário, para ele.

mas ao contrário do filme "feitiço de áquina", havia uma hora que se encontram, próximo do pôr e nascer do sol.

nestas horas mágicas, quem quisesse, podia assistir no jardim da frente da casa os reencontros da mulher grande e do homem pequeno, todos os dias se conhecendo novamente.

todos que iam para o trabalho e todos que voltavam dele.